sábado, 14 de novembro de 2020

Paulo, Marcos, Barnabé e as urnas




Sigo sendo igreja com todos em paz. Não sem dúvidas. Não sem diversidades. Mas, com Sua paz.

 

 

 

Eu não tinha entendido. Ele simplesmente desistiu. Ou, pelo menos, foi o que pareceu. Juntos anunciamos o evangelho em Salamina e ele parecia tão pleno, tão convicto de que estava cumprindo seu chamado! Deus estava fazendo grandes, grandes coisas.... (At 13:5) Mas, mesmo assim, sem explicar, voltou para casa (At 13:13). Agora, Barnabé insistia em trazê-lo (At 15:38).

- Paulo, você precisa ser mais maleável. João teve seus motivos. Insistiu.
 

- Não vou debater isso com você meu irmão. Ele nos deixou antes. E vai fazer de novo. Acho que não pensamos mais a mesma coisa.

Não havia como me convencer. E, pelo jeito, nem a Barnabé. Assim, me separei desse homem a quem tanto prezava. Não somente por sua ajuda, mas, principalmente, por quem ele era.

Anos se passaram. A vida ensinou a Marcos. E a vida também me ensinou. Muito. Percebemos que não nos tornamos inimigos naquele tempo, mas, simplesmente, pensávamos diferente um do outro. Amávamos ao Senhor da mesma forma que agora. Com a mesma intensidade, com o mesmo desejo de vê-Lo estabelecer o Seu reino, a ponto de chorarmos em oração, mesmo quando separados. Aprendemos com o passado. E vejo agora como ele é importante, como é útil ao ministério. Por isso estou pedindo a Timóteo que o traga (2 Tm 4:11), para caminharmos juntos até o fim, para que possamos, juntos, construir agora um futuro melhor.

2020. Quanto tempo se passou desses eventos! Mas, ainda assim, como me são úteis!

Olho ao redor e percebo que irmãos e irmãs a quem amo verdadeiramente em Cristo, que O servem ainda com mais intensidade do que eu, estão caminhando em direção diferente no momento de escolher nossos representantes no poder. Estaria eu certo e, eles, errados? Ou seria exatamente o inverso? Não posso dizer com clareza agora. Mas sei que amamos ao mesmo Senhor e queremos a mesma coisa. Ainda que pensemos de forma diversa sobre o caminho, farei minha escolha amanhã com a certeza de que o Senhor de Marcos, Paulo, Barnabé, Timóteo e tantos outros é o mesmo Senhor nosso. Posso não ver com clareza, mas nosso Senhor vê. O ontem, o hoje e o amanhã.

Ah, o amanhã! Será ali que veremos com clareza o que não vemos hoje. Será ali que nossos olhos verão de forma perfeita.

Mas até lá, sigo crendo que o que nos une é muito maior do que o que nos separa. Que choramos pelos mesmos motivos. Que desejamos o mesmo fim: Jesus reinando! Então, sigo sendo igreja com todos em paz. Não sem dúvidas. Não sem diversidades. Mas, com Sua paz.

Que você, meu irmão, minha irmã, amanhã vá para as urnas com essa mesma paz.

Um grande abraço, Eduardo.


sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Se eu tivesse voz para falar à igreja evangélica nessas eleições de 2018..



Antes de tudo eu reconheceria quem sou: alguém que perdeu a oportunidade de ser tido como sábio, dada as circunstâncias que vivemos (Pv 17:28).

Mas aproveitaria para, também, dizer algumas palavras.
 
E começaria emprestando a sabedoria de um dos mais influentes escritores de nossos dias, Tim Keller:

"(os cristãos) não podem odiar os inimigos ou justificar oprimir as pessoas que eles acham que são opressores." (Making Sense of God: An Invitation to the Sceptical, p. 210)

 Tivemos um grande período de um partido no poder. Penso que todos podemos dizer que foi um bom momento na economia. Segundo alguns, consequência não da capacidade desse partido mas, sim, de uma conjuntura internacional favorável. Outros, discordam. Independente disso, o tempo no poder desse partido chegou ao fim com uma quantidade enorme de corrupção trazida à tona pela operação Lava Jato. Alguns tentam desqualificar as ações, mas o fato é que está lá. Esse partido, o PT, errou. Para alguns os fins justificam os meios. Para conseguir dar melhores condições de vida ao menos favorecido em um sistema político extremamente perverso e ganancioso, o partido precisou jogar o jogo que todos jogaram. Para mim, não. Os fins não podem justificar os meios. Votei no PT pensando que teríamos uma mudança de valores, afinal, era o trabalhador chegando ao poder. Talvez eu pudesse dizer que fui enganado, mas hoje chego à conclusão que fui apenas inocente.

Ainda, esse mesmo partido cometeu, a meu ver, um outro erro. Na tentativa de proteger a vida dos homossexuais, que têm, historicamente, sofrido uma profunda discriminação, trouxe um grupo de seus representantes para buscar uma forma de orientar professores quanto à esse problema. Aqui, talvez, mais uma vez, esteja sendo inocente. Alguns vão afirmar que o que eles queriam era realmente liberar geral e expor nossas crianças à essa política de identidade de gênero que tanto nos choca. Mas não vejo assim. Penso que o erro foi não ter chamado as diversas representações sociais para discutir a proposta antes da criação dos tão criticados vídeos. E, assim, ficamos, aqueles que têm uma visão tradicional da teologia bíblica, chocados. A resistência foi geral, e, até onde eu sei, o projeto como um todo não foi colocado em prática.

Ou seja, a resistência da sociedade impediu que a proposta fosse implementada. Não que não esteja tudo pronto para tal. Mas não foi implementada. Uma democracia funciona assim: a representação da sociedade. em suas diversas forças no congresso, aprova ou rejeita propostas.

Mas, então, nasceu um outro lado na história.

O lado de uma resistência, ou, quem sabe, de profunda força opressora, contra "tudo o que está aí". É claro que eu entendo os motivos. Eu não gostaria de ver de novo no poder o partido que me enganou. Não gostaria de ver de volta o partido que loteou cargos públicos com gente despreparada para ocupar os espaços que passaram a ocupar. Não gostaria de ver de volta na diretoria da Petrobras novos indicados desse partido. Mas o pior de tudo para mim: não gostaria de ver novamente no poder o partido que não fez uma revisão de tudo o que aconteceu, reconhecendo os erros e buscando mecanismos para que eles não se repitam.

Mas não posso, com esse desejo, apoiar o extremo oposto dessa balança. E, pior para mim: extremo oposto que se intitula cristão. E o faz ao mesmo tempo que diz que o problema da ditadura foi que torturou muito e matou pouco, que a resposta para violência é mais violência ainda, que mãe e avó criam desajustados, que 13o salário é "jabuticaba" e precisa acabar, que vai taxar em 20% os que hoje são isentos de IR e que vai vender todas as empresas públicas, inclusive as estratégicas para o país.

Eu tenho poucas dúvidas que na época da ditadura havia gente ruim de todos os lados. Vi entrevista de alguém que descreveu como assassinou uma pessoa importante na ditadura. Mas nem por isso posso defender que a tortura, ou até mesmo a morte, são o caminho correto. Da mesma forma, não posso conviver com a violência na qual estou inserido todos os dias na cidade do Rio de Janeiro, com a maldade dos bandidos armados de fuzil, e achar que tudo se resolve de uma maneira educada. Sim, vai haver violência do Estado para conter essa violência da marginalidade. Mas daí não posso afirmar que esse é o único caminho e que não há profundos fundamentos sociais no nascedouro da marginalidade nos guetos da miséria ao meu redor. Mesmos fundamentos, talvez, para as famílias de mães abandonadas pelos maridos e que precisam criar filhos sozinhas, trabalhando de sol a sol, em empregos a horas de distância de suas casas. Sim, vai haver dificuldades nessa criação, mas daí posso afirmar que todos serão desajustados?

Da mesma forma imagino que empreender em nosso país é um desafio. Há muita carga tributária envolvida. Mas quando se pensa em cortar a gente olha logo para o lado mais fraco, o trabalhador? Essa mesma mãe que sai 5 horas da manhã, retorna ás 20h da noite, que já é cobrada pela criação dos filhos, vai ser a que vai pagar a conta para um ambiente mais propício ao empreendedorismo? Isso aí é um valor cristão? Diminuir a alíquota do IR de quem ganha mais para taxar quem ganha menos deve ter algum fundamento econômico que eu desconheço, mas independente disso me soa tão cruel quanto tirar o 13o salário daquela mãe. E claro que eu sei que há muito funcionário público que não faz nada e a gente precisa resolver isso, porque não há como a sociedade pagar por tanta incompetência. Mas ao mesmo tempo vender empresas estratégicas para a soberania nacional?

Não, esse caminho não posso, não consigo trilhar. Há que se caminhar em uma 3a via.

Sei que há um anseio muito grande em nosso "arraial" para impedir que nossas crianças sejam expostas a uma doutrinação LGBT. Eu compartilho muito desse anseio. Mas me preocupo quando tentamos uma via estatal para algo que deveria ser trabalhada pela via "eclesiástica". Explico: O homossexualismo não é um pecado aos olhos do mundo. Ponto. Precisamos entender isso. E, penso, é uma das maiores dificuldades para a igreja em nossos dias, porque é um pecado cometido apenas contra Deus, em nossa visão cristã de mundo. Não é cometido contra outro ser humano. Assassinato, adultério, roubo, tudo isso tem algum elemento social envolvido e foram, de alguma forma, encampados em nosso "contrato social". Mas o homossexualismo, sem o elemento "Deus" envolvido, não é um pecado para a sociedade. E vai continuar não sendo, independente de um presidente que queira lutar contra a sua influência entre nós. Essa semana a Globo colocou no ar o primeiro beijo entre homens na "novela da tarde", Malhação. A gente acha que isso é menos influente do que o kit gay? E acha que a Globo vai parar de tratar o tema dessa forma se o Bolsonaro for eleito? A via, pra mim, é a igreja e a semeadura do reino de Deus e Sua justiça. Isso vai nos "proteger". Isso vai proteger nossas crianças.

Há muito mais a ser dito. Mas não não tenho espaço nesse texto para continuar.

Assim, se eu tivesse voz para falar à igreja evangélica nas eleições de 2018 eu diria o seguinte: do PT, do mundo, eu espero exatamente o "kit gay", a corrupção, as fake news e tudo o mais que uma sociedade sem Deus pode gerar. O Senhor me disse que seria assim. Mas de um cristão eu não espero que se torne divulgador de fake news, opressor, violento, contra o pobre e o excluído. Acho que a história já nos mostrou o que pode acontecer quando o cristianismo se torna a "religião do estado", e tenho muito medo de estarmos caminhando a passos largos para ver a história se repetir.

Precisamos buscar uma terceira via.

quarta-feira, 6 de junho de 2012

A arte de se tornar desnecessário

Tenho uma vida dupla. Confesso. Durante o dia sou um funcionário público, desenvolvendo software para o Governo Federal. De noite, porém, me transformo em teólogo e passo a ajudar na Igreja de Jesus.

Claro que é uma brincadeira. Não dá para dividir a vida em dois turnos. Clark Kent pode até ter conseguido durante um tempo, mas chegou uma hora em que a Lois percebeu. Se ele, que era o super-homem, não conseguiu, imagina eu? Na verdade, o que acontece é que durante o dia lidero um grupo de desenvolvedores como teólogo, e muitas vezes me vi dirigindo louvor como analista de sistemas.

Mas por que essa conversa toda?

Porque é muito legal poder perceber a vida corporativa com a ótica teológica e, ao mesmo tempo, perceber a igreja pela ótica corporativa.

E percebo algumas coisas interessantes nos dois mundos.

Uma dessas percepções é sobre nossa auto-destruição. Não, você não leu errado. Eu penso que todos somos fadados, ou deveríamos ser, a nos tornar desnecessários.

Um advogado deveria lutar pela justiça, certo? Ora, se a sociedade se tornasse tal, em que as pessoas se respeitassem e resolvessem seus conflitos, o advogado seria desnecessário. Um médico deveria lutar pela saúde, pela cura. Uma vez que chegássemos a um avanço social e tecnológico correto, as doenças cessariam e o médico seria peça de museu. Para não dizer que não falo de minha profissão: Um desenvolvedor de software deveria criar sistemas com qualidade, entendendo bem os requisitos do cliente, de forma a deixar as coisas rodando por si só, sem necessidade de intervenção.

Imagino que você esteja pensando que eu estou simplificando as coisas ao extremo. Eu sei disso. Claro que esse pensamento só tem sentido em um mundo perfeito. E tal mundo não irá surgir pela atuação humana, mas sim porque o Senhor da história irá retornar, fazendo surgir novos céu e terra.

Entretanto, em alguma medida, deveríamos ter esse alvo.

O problema é que nos tornamos, de alguma maneira, dependentes das situações que deveríamos corrigir. Um advogado precisa que haja conflitos, senão não tem como sobreviver. Um médico, para tocar sua vida, criar seus filhos, precisa de doentes, de acidentes. E um analista de sistemas precisa que o sistema trave de vez em quando para que a vida continue.

Saindo da “esfera corporativa”, como encarar isso quando pensamos na liderança de uma igreja?

Como líderes, fomos chamados para desenvolver as pessoas de nossa comunidade, capacitando-as, dentro daquilo que o Senhor permite, a viverem por si só. Não no sentido de isolamento, mas no sentido de auto suficiência para entenderem a vida à luz da Palavra, e serem sal e luz no dia a dia.

A pergunta para cada um daqueles que lideram a Igreja é: Estamos conduzindo nosso ministério para nos tornar desnecessários? Estamos realmente lutando para apresentar todo homem perfeito ao Senhor (Col 1:28)?

Ou estamos, de alguma forma, alimentando um sistema que seja dependente de nós, e, em vez de gerar adultos, estamos mantendo crianças? Quando tudo tem que passar pelas mãos do líder, temos um problema, seja na Igreja, seja nas empresas. Qualquer livro mais atualizado sobre o tema “liderança” ensina isso. O verdadeiro líder, aquele que segue o exemplo de Jesus, deve ser o primeiro a servir. E, tanto na Igreja quanto na corporação, nosso maior serviço é estimular o desenvolvimento daqueles que lideramos. Um dos maiores impulsionadores disso acontece quando entregamos projetos aos liderados, explicitando não somente a responsabilidade, mas, também, dando a autoridade necessária. Não fazer isso é manter o status quo do “Eu mando e você obedece”.

Pode ser pior. O líder quer ou precisa fazer tudo. Prega, dirige o louvor, batiza, aconselha. Em algumas situações – pequenas comunidades nascentes – isso pode ser necessário. Mas é algo que deve ser modificado o mais cedo possível. Primeiro, porque os líderes são seres humanos, com limitações físicas e mentais. Por isso, estão sujeitos ao estresse e à estafa. Segundo, porque fazendo tudo o líder está exposto ao sentimento de grandeza: “Só eu faço isso direito”. Nada mais perigoso. O resultado desse tipo de condução é conhecida de todos os que já tem algum tempo de caminhada no Reino.

Enfim, a pergunta por nossos objetivos de liderança deve estar presente em nossas mentes todo o tempo. É muito fácil para nós, pecadores, esquecermos para o quê fomos chamados e ficarmos uma vida inteira, querendo ou não, alimentando uma dependência que não é bíblica.

Assim, como disse em relação aos advogados e médicos, sei que não vamos ter isso plenamente do lado de cá da eternidade.

Mas, não deveria ser o alvo?

(publicado na Cristianismo Hoje, versão web: http://www.cristianismohoje.com.br/materia.php?k=856)

quinta-feira, 29 de março de 2012

Conforto, vida simples e cristianismo.


Confesso, antes de qualquer coisa que escrever, minha pecaminosidade. Não "para o mal", se pecado pudesse não ser para o mal. O que confesso é meu pecado de muitas vezes ser extremo em algumas coisas.

O dinheiro e o trato dele é uma dessas coisas que tenho uma tendência "extrema". Dessa forma, peço desculpas antecipadas por qualquer coisa que escreva. Sempre, sempre, meu intuito é pensar junto com os irmãos (que coisa maravilhosa essa!) sobre aquilo que o Senhor nos ensina em sua Palavra.

Em relação ao tema "dinheiro", um dos textos mais importante, no meu ponto de vista, é esse (2 Co 8:8-15):

Não vos falo na forma de mandamento, mas para provar, pela diligência de outros, a sinceridade do vosso amor;  pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, se fez pobre por amor de vós, para que, pela sua pobreza, vos tornásseis ricos.  E nisto dou minha opinião; pois a vós outros, que, desde o ano passado, principiastes não só a prática, mas também o querer, convém isto.   Completai, agora, a obra começada, para que, assim como revelastes prontidão no querer, assim a leveis a termo, segundo as vossas posses. Porque, se há boa vontade, será aceita conforme o que o homem tem e não segundo o que ele não tem. Porque não é para que os outros tenham alívio, e vós, sobrecarga; mas para que haja igualdade, suprindo a vossa abundância, no presente, a falta daqueles, de modo que a abundância daqueles venha a suprir a vossa falta, e, assim, haja igualdade,  como está escrito: O que muito colheu não teve demais; e o que pouco, não teve falta.

Penso que aqui temos um bom resumo do tratamento do dinheiro. (Aliás, de passagem: Jesus falou mais sobre dinheiro do que sobre qualquer outra coisa...):

1) Abundância de uns supre a falta de outros
2) Não é "bandalha".. Não é para sobrecarregar quem tem. E, sendo sistemático, não é para sustentar preguiçoso. "Quem não trabalha, não coma", disse o mesmo autor de coríntios à Igreja dos tessalonicensses.
3) Há uma igualdade em vista. Não entendo ser uma porta para o comunismo. Não acho que teremos igualdade em tudo. Há diferenças entre nós. Mas creio em uma igualdade de condições básicas para vida humana.

Quanto a esse texto, Simon Kistemaker diz: "Ele (Paulo) enfatiza uma igualdade material, para que os crentes abençoados com um superávit, de boa vontade partilhem seus bens com outros, que não têm como satisfazer suas necessidades básicas" (Comentário do Novo Testamento - http://www.editoraculturacrista.com.br/produtos.asp?codigo=92 - pg 402)

Além disso, não me esqueço do que li de Calvino no livro "O Pensamento Econômico e Social de Calvino" (http://www.editoraculturacrista.com.br/produtos.asp?codigo=250): "O pobre é o ministério do rico"

Aliás, esse livro seria muito importante como material para discussão de justiça social. É uma pena que está esgotado. Não deve ter vendido muito ;-) Nele, Calvino é duro em alguns momentos, como por exemplo:

"Reina um insaciável desejo de comprar, esbanja-se e pilha-se em despesas inúteis o que Deus destinara ao serviço de outrem. Bem se pode dizer que temos as entranhas mais duras que ferro, por isso que não somos movidos a outra disposição ao lermos a presente história (comentando sobre Atos). Então os fiés prodigalizavam abundantemente seus bens... mostravam abertamente e com franca sinceridade o que possuíam. E nós cogitamos e sonhamos mil meios oblíquos mercê dos quais para nós fraudulentamente arrebanharmos tudo quanto é coisa. Eles depositavam tudo aos pés dos apóstolos. E nós não nos envergonhamos de pilhar como assaltantes, mediante audacioso sacrilégio, o que foi consagrado e ofertado a Deus." ("O Pensamento Econômico e Social de Calvino" (http://www.editoraculturacrista.com.br/produtos.asp?codigo=250), pg 466)

Não devemos ser tolos. Calvino escreveu em uma época onde não tínhamos a realidade e a dinâmica econômica de nossos dias. Mas que não nos apanhemos com os mesmos subterfúgios que ele cita em seu comentário.

Em um mundo de extrema diferença social tão brutal, o texto bíblico citado tem que falar muito alto pra gente. Não apenas aos pastores, mas a você e a mim.

Nosso país tem melhorado, mas aproximadamente 50% das casas não têm saneamento básico. Mesmo que eu esteja errado nessa estatística, não podemos negar a realidade de uma favela de Manguinhos, aqui no Rio. Como podemos, como cristãos, conviver com isso ao nosso lado? Então, mesmo sendo lícito, devemos manter um estilo de vida caro? Mesmo que possamos, por nossos ganhos, nós realmente podemos conviver com nossos irmãos na fé sem acesso à saúde, educação, saneamento básico, moradia? Ou devemos usar aquilo que o Senhor tem nos dado para fazermos o que Paulo instrui em 2 Co 8?

Nas férias de janeiro li um livro muito bom do Dr Wesley Duewel, missionário na India por muitos anos. O título é "Avalie sua vida" (http://www.candeia.com.br/vidacrista/detalhes/livro43.html - a minha edição é mais antiga) . São capítulos como "avalia sua vida pelo seu amor", "avalie sua vida pelos seus investimentos"... No capítulo intitulado "avalie sua vida pelo seu sacrifício", eu grifei algumas coisas:

"da próxima vez que estiver pronto para gastar dinheiro em roupas, enfeites, ou na casa, pergunte a Deus se Ele tem alguma sugestão diferente a fazer. Na bíblia, a simplicidade está sempre associada à santidade"- pg 146

"Meus pais(...) gastavam o mínimo possível em suas necessidades pessoais. Comiam com simplicidade, viviam simplesmente e davam tudo o que podiam para as missões ou outros empreendimentos para Deus. Eu não herdei quase nada que pudesse ser medido financeiramente, mas recebi grande riqueza em termos de benção e oração."- pg 147.

Mas a melhor citação fala da história de Stanley Kresge. Ele era dono de uma grande empresa nos EUA, a K Mart Corporation. Doou muito dinheiro. Um missionário da mesma missão de Duewel os visitou. Ele diz que:
"certa vez ficou observando a Sra Kresge lutar com uma velha torradeira que se recusava a funcionar. (...) Em minha mente eu podia ver todas aquelas fileiras de torradeiras novas e brilhantes nas lojas K Mart em todo o país, mas ali estava ela com sua velha e usada peça de museu"- pg 148

No fim das contas, me pergunto se nosso problema mais radical não está assentado em nossa prioridade em relação ao reino, e nossa esperança de viver nesse reino. Se eu realmente tenho como alvo a Jesus e Seu reino, de que me valem as coisas materiais? Eu não me sinto um asceta. Acho que devemos desfrutar das bençãos que o Senhor tem nos dado. Podemos viver uma vida confortável. Nossos filhos podem, e devem, estudar nas melhores escolas que podemos pagar, por exemplo. Mas comprar, comprar e comprar... E aquilo que o "ladrão pode roubar e a traça comer"?

Meu sentimento é que podemos estar passando dos limites.

O que podemos fazer?

1) Pensar, sob a ótica da Palavra.
2) Orar, para entendermos a vontade do Senhor e não sermos radicais.
3) Pedir mais fé, como os discípulos, para realizar as mudanças que preciso em minha vida.
4) Propagarmos isso em nossas comunidades. Onde estou sou embaixador de Jesus, para ser sal e luz.

Pode ser simplista. Mas se fizermos isso, creio que o Senhor irá nos visitar.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Perguntas complicadas...

Meu irmão do Igreja Missional me pediu algumas perguntas para, quem sabe, serem feitas a alguns líderes.

Em vez de responder ao email dele, resolvi colocar aqui para compartilhar.

Pedido em relação a todas as questões:  Dê uma resposta prática, que diga: "Faça isso", "Não faça isso". Não uma resposta genérica, de quem não quer pensar no assunto ou não quer dar o "pulo do gato".

1 - Como equilibrar a dimensão horizontal e vertical da igreja? Inspirado no último post do blog Igreja Missional.

2 - Como administrar a constante luta por mais tempo de qualidade com Deus, família, amigos, em um tempo onde moramos cada vez mais longe dos locais de nossas atividades profissionais?

3 - Aliás, você sabe realmente o que é a dificuldade apontada na pergunta 2? Ou seja, você vive essa dificuldade no dia a dia? Provavelmente não, uma vez que pastores "moram" perto de suas igrejas, na maior parte dos casos. Assim, melhoro a pergunta: você já viveu isso no seu dia a dia, antes de se tornar pastor? Se sim, como equilibrou isso?

4 - Como equilibrar as diferenças de "classes" dentro de uma igreja? Ou seja, como ter debaixo do mesmo teto, no mesmo momento de culto, pessoas de classe média, alta, baixa? Isso é possível?

5 - Como criar um "modus operandi" que proteja os pastores deles mesmos? Ou seja, como salvar os pastores de se tornarem os donos da verdade e do poder dentro de uma igreja? Mais: Como protegê-los de se isolarem em seus mundos, sem ter com quem compartilhar a vida, os pecados, as lutas, os fracassos? Porque a comunidade quer super heróis e muitos pastores entram nessa loucura e tentam ser como tais.

6 - Como ter igrejas onde a força esteja na comunidade e não no carisma de sua liderança? O que os pastores devem fazer para se tornar "desnecessários", ou seja, realmente estabelecer um ministério que busque apresentar todo homem perfeito para Deus, e, ao chegar o mais próximo disso, se tornar dispensável para aquela comunidade, abrindo espaço para fazer o mesmo trabalho em outro lugar?

7 - É possível pregar um evangelho genuíno em uma igreja, sendo alguém que depende financeiramente dessa igreja? Ou seja, pregar algo que vá frontalmente contra a prática do povo daquele lugar, sem receio de ser "dispensado" de suas atividades. Por exemplo, pregar em igrejas de classe média alta que ter um automóvel de R$ 100.000 não condiz com um país onde há irmãos em Cristo sem necessidades básicas - alimentação, saneamento básico, moradia salutar e educação decente?

Apenas algumas perguntas para começar.

Depois eu vou perguntar ao meu amigo Roberto, do Igreja Missional, se ele vai ter coragem de perguntar todas.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

A igreja e a relevância no mundo - a capacitação para sermos relevantes

Diariamente perseveravam unânimes no templo, partiam pão de casa em casa e tomavam as suas refeições com alegria e singeleza de coração, louvando a Deus e contando com a simpatia de todo o povo. Enquanto isso, acrescentava-lhes o Senhor, dia a dia, os que iam sendo salvos.
(Atos 2:46-47)

Esse verso me impressiona.

Perseverança, unanimidade e comunhão, com alegria e simplicidade.

Coisas que não encontramos mais por aí em nossa sociedade. E, infelizmente, nem na Igreja.

Quando pensamos, então, em contar com a simpatia do povo... Ô sensação esquisita.

No post anterior eu pensei um pouco sobre qual deveria ser a nossa posição, como discípulos de Jesus, em relação à desigualdade social que vivemos.

Finalizei aquele post dizendo que em outro momento pensaria um pouco sobre "como" praticar uma vida cristã frente a isso, e gostaria de iniciar agora.

Eu tenho comigo que as duas coisas estão completamente relacionadas: simpatia do povo e cristianismo vivido no dia a dia.

O que parece saltar aos olhos, no versículo que abra esse texto, é o fato de que a praticidade da fé, o viver cristão no cotidiano,  nas tarefas e lutas do dia a dia, levou o povo a nutrir simpatia pela Igreja nascente.

Aqueles malucos eram diferentes. Vendiam o que tinham para colocar tudo em comum, de forma a viverem uma comunidade que condizia com o termo: "comum ". Ainda, pararam de fazer o que todos na época faziam: mentir, roubar, adulterar. E, mesmo sob a perseguição dos judeus - no início da Igreja, os únicos que a perseguiam - continuavam se reunindo, e no templo! Corajosos, no mínimo.

Os de fora não sabiam, mas eles só podiam fazer isso porque foram capacitados com alguém que vinha de fora deles, como nos mostra o início do capítulo 2 de Atos.

E aqui está, penso, a primeira coisa que podemos fazer para vivermos novamente essa relevência no mundo, e sermos instrumentos do Senhor para espalhar Sua paz e Sua justiça: Buscarmos a capacitação do Espírito Santo.

Não existe igreja relevante onde o Espírito Santo não habita. Na verdade, deixa eu melhorar: Não existe Igreja onde não há a presença do Espírito Santo.

O pastor Antonio Carlos Costa (http://twitter.com/antonioccosta_) foi muito feliz em um tweet: "A igreja do Brasil quer que Lázaro ouça, fale, coma, beba e ande sem ter ouvido a voz onipotente dizer-lhe: 'Vem para fora'.". Alguns de nós, eu inclusive, têm falado muito sobre a necessidade da Igreja resgatar sua relevância no mundo. Discutimos, publicamos posts em diversos blogs e no twitter. Falamos que temos que mudar isso e aquilo, que precisamos nos voltar mais para a Palavra, nos dedicando a um tempo de comunhão com Jesus.

Creio que estamos falando demais sobre algo acontecer, sem que os pré requisitos estejam preenchidos.

Não vai ser por nosso tanto falar que a Igreja vai mudar. Vai ser pela operação soberana do Deus soberano, nos enchendo com Seu Espírito.

O que não siginifica que devemos sentar e esperar isso acontecer.

Se você foi curioso e leu o primeiro capítulo de Atos, encontrou essa pérola: "Todos estes perseveravam unânimes em oração, com as mulheres, com Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos dele. (Atos 1:14)". Não devemos ficar esperando. Devemos orar e perseverar.

Quantas reuniões de oração ainda existem nas igrejas de hoje? E, nas que perseveram em manter o encontro, qual é a frequência média? E em nossos lares? E na sua vida particular com Deus?

Creio que a resposta a essas perguntas é o início de uma boa resposta sobre a situação atual da Igreja. E deve ser, também, o início de um avivamento na minha vida e na sua, preenchendo o pré requisito para nos tornarmos relevantes novamente.